quarta-feira, 26 de novembro de 2008

BELÉM E O FUTURO DO FÓRUM SOCIAL MUNDIAL


Introdução

O Fórum Social Mundial volta em sua edição centralizada ao Brasil depois de percorrer outros países e continentes e vários formatos novos. E se realizará, entre 27 e 31 de janeiro de 2009, em Belém do Pará, num contexto internacional de crise do sistema neoliberal hegemônico desde os anos 80, cujas características confirmam as básicas críticas que lançaram o Fórum Social Mundial como referência internacional no começo do século em curso.

Ao mesmo tempo em que a polarização com o pensamento econômico de Davos estará mais aceso que nas versões anteriores, experiências importantes na América Latina em particular mostram que outro mundo continua sendo possível, mas avança ainda de forma fragmentada e com percalços, vividos pela experiência dos movimentos sociais e governos progressistas e de esquerda no continente. Mesmo assim, é nítido o caráter anti-neoliberal ou pós-neoliberal de reformas importantes promovidas por estes governos, surgidos no processo de luta contra a hegemonia neoliberal tardia dos governos dos anos 90 que sucederam as antigas ditaduras militares em países centrais da América do Sul, especialmente.

Escolhido com antecedência de quase dois anos, o tema da Amazônia e de seu papel no equilíbrio ambiental do planeta deveria inicialmente ser o central de todo o evento, mas pode ficar circunscrito ao primeiro dia de atividades (o 28, escolhido como o do diálogo entre a Amazônia e o mundo) e diluído em outros dez eixos escolhidos pelo Conselho Internacional para os demais dias. Será um tensionamento permanente entre o local/regional e o mundial, o vivido entre os dias 29 e 30.

Se o cenário mundial é francamente favorável a um grande sucesso do Fórum Social Mundial, é necessário pontuar a crise que desencadeou um grande debate estratégico no interior do Conselho Internacional e dos movimentos sociais e organizações não-governamentais que o constituem. Pretendemos discutir aqui dois elementos dessa crise, suscitados em particular pelos grandes movimentos sociais internacionais e latino-americanos: o da “utilidade” do Fórum Social Mundial para o avanço das lutas anti-neoliberais neste período de nossa historia, ou, em outras palavras, o da eficácia de seus debates no curso das lutas concretas dos movimentos sociais no plano internacional; e o do diálogo ainda não realizado entre as premissas do outro mundo possível preconizado pelo FSM e os governos progressistas e de esquerda da América Latina.

Apoiado desde o início de suas atividades em Porto Alegre pelos partidos políticos progressistas e de esquerda da América Latina, pela primeira vez o Fórum Social Mundial passa a ser um elemento do debate estratégico desses partidos, organizados no Foro de São Paulo. O aceite do Foro de São Paulo como membro observador do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial, no final de 2007, polêmico antes e depois de aprovado, pode se tornar um momento de um processo de frutuosa discussão – acalorada, tensa, por vezes conflituosa – entre partidos políticos, movimentos sociais, organizações não-governamentais e governos progressistas e de esquerda na América Latina. É um processo que pretendemos também discutir neste artigo.

De qualquer modo, o Fórum Social Mundial de Belém 2009 será um importante momento da luta política e ideológica para os movimentos sociais e políticos contra o neoliberalismo, por um outro mundo possível e necessário, pela superação do capitalismo como modo de organização das relações econômicas, políticas e sociais. A participação do PT neste debate enriquecerá aos demais atores políticos e sociais deste processo, e muito também o enriquecerá, se conseguirmos fazer com que a agenda do Fórum Social Mundial se torne parte da agenda política do Partido neste período anterior e posterior ao evento de Belém.

A Crise Financeira Internacional e as Oportunidades que se Abrem
Quando se definiu a agenda política do Fórum Social de Belém, ainda não se delineava a profundidade da atual crise financeira e econômica internacional. A última reunião do Conselho Internacional do FSM em Copenhagen, Dinamarca, se realizou nos marcos da crise do mercado imobiliário estadunidense e de suas primeiras repercussões no sistema financeiro internacional. Coincidiu também com o anúncio das primeiras iniciativas do governo Bush de socorro ao sistema financeiro e dos debates sobre as iniciativas da União Européia que viriam a ser adotadas logo em seguida.

Há cerca de dois anos, o Conselho Internacional iniciou um processo de debate estratégico sobre o futuro do FSM. Partindo de dezenas de contribuições chegadas de movimentos sociais, ONGs e personalidades ligadas à história do FSM, o ano de 2008 foi marcado por uma reflexão sobre as conquistas e derrotas dos movimentos anti-globalização e anti-neoliberais que deram origem ao processo do Fórum desde o final dos anos 90.

Parece evidente que os fundamentos da crítica do Fórum Social Mundial ao pensamento econômico neoliberal e suas práticas concretas nos planos local, regional e mundial foram robustecidos com a atual crise econômica. O “fim da história” preconizado pelos neoliberais após a queda do Muro de Berlim e a hegemonia dos capitais financeiros internacionais sobre as relações econômicas internacionais e as políticas econômicas dos Estados nacionais deveria abrir, segundo seus ideólogos, um período de progresso, desenvolvimento, paz e prosperidade para o mundo. O que se viu nestes trinta anos (dos 80 do século XX até os dias de hoje), no entanto, foi uma sucessão de crises econômicas e sociais que configuram hoje um mundo mais desigual, de recursos minerais cada vez mais escassos, conflagrado por guerras imperialistas e pela crise dos Estados nacionais, destinado a manter bilhões de pessoas em condições abaixo da linha da pobreza para sustentar o consumo desenfreado de uma minoria e os escorchantes lucros de um sistema financeiro cada vez mais virtual e globalizado.

Neste sentido, a crise financeira soma-se à crise de hegemonia política e militar dos Estados Unidos e à derrocada da “era Bush”, encerrada politicamente pela recente vitória eleitoral dos democratas e de Barak Obama nas eleições estadunidenses, mas cujas conseqüências se farão sentir por um longo período no rastro dos estragos produzidos contra a humanidade nestes oito anos de governo desastroso.
A presente crise financeira se articula também com um conjunto de outras crises anteriores e em curso produzidas na esteira da devastação neoliberal – a crise de alimentos que se reflete no aumento dos preços limitador do consumo das minorias e na carência nutricional e fome das maiorias; a crise energética produzida pelo esgotamento do modelo econômico baseado no consumo individual e coletivo desenfreado dos combustíveis fósseis pelas economias capitalistas centrais e pelas elites das economias capitalistas periféricas; a crise ambiental, que incorpora e transcende a crise energética e se projeta para as causas do fenômeno do aquecimento global e de suas conseqüências para o futuro do planeta, um dos temas determinantes para a escolha de Belém como sede do Fórum Social Mundial em 2009.

Mas essa crise financeira, que não é a primeira vivida no contexto da economia mundial recente, difere fundamentalmente daquelas geradas a partir de economias como México, Rússia e de países do Sudeste Asiático pelo fato de ter seu epicentro nas economias capitalistas centrais e de se abater violentamente sobre a chamada “economia real” desses países. Estados Unidos e Japão já estão abertamente em recessão, e a União Européia caminha rapidamente para ela em 2009. Empregos, salários, bem-estar social de camadas médias da população e a estabilidade destes países para planejar o futuro individual e coletivo de suas sociedades foram no ralo da crise financeira, da qual não se pode ainda avaliar o futuro e o ritmo de (provável) aprofundamento ou (improvável) reversão.

Neste período, por várias razões políticas e econômicas, os chamados países emergentes constituíram condições favoráveis para enfrentar, no curto prazo, as conseqüências da crise financeira e econômica internacional. Ainda que países como China, Índia, Brasil e Rússia tenham acumulado condições de manter condições de crescimento econômico moderado no futuro próximo, a manutenção do atual modelo neoliberal nas relações internacionais e na organização das suas políticas internas não sinaliza nenhum quadro de estabilidade de médio e longo prazos.

Neste sentido, enfrentar a crise numa perspectiva de esquerda ou progressista exige destes governos e principalmente dos governos latino-americanos que se colocam no campo do enfrentamento com o sistema neoliberal a ocupação das enormes oportunidades abertas com a esta mesma crise que nos ameaça. A saída mais simples e mais fácil será a de estabilizar a crise atual sem alterar significativamente a correlação de forças nos organismos decisórios das relações econômicas internacionais e impondo internamente nos países políticas que penalizem a toda a sociedade pelos erros e ganância de suas elites econômicas.

Na América do Sul em particular, o Brasil joga um papel determinante para o aprofundamento do processo de integração de nossas Nações na UNASUL – por ser a maior economia regional, por ter espaço de interlocução com todos os governos da região, pela fragilização da posição dos Estados Unidos decorrente de suas crises internas, entre outros fatores. Se joga um papel importante no cenário mundial, é na América do Sul que o Brasil poderá jogar como protagonista um jogo que fortaleça a unidade regional em bases radicalmente opostas às experimentadas pelas experiências de mera integração de mercados produzidas no mundo pré-crise.

O debate sobre os caminhos para um outro mundo possível se tornar realidade
Se as alternativas políticas ao neoliberalismo estão em construção e são, muitas vezes, fragmentadas e limitadas, o fato é que elas colocam em debate na prática concreta de governos, partidos e movimentos sociais a construção de bases para o outro mundo possível preconizado pelo Fórum Social Mundial desde sua origem se tornar realidade.

Não se pode deixar de reconhecer o papel relevante jogado pelo FSM neste processo. No começo dos anos 2000, aglutinou toda uma gama variada de lutas e movimentos anti-globalização que marcou a resistência simbólica à agenda neoliberal. Foi capaz de congregar uma pluralidade de atores sociais e políticos de várias matizes ideológicas no debate sobre a necessidade de um combate internacional a uma estratégia igualmente internacional do capital. Ao desafiar diretamente o Fórum Econômico de Davos, contrapôs à hegemonia neoliberal um acervo de pensamento critico alternativo que alcançou grande visibilidade e o transformou em espaço reconhecido de resistência de todos/as os que lutavam contra o neoliberalismo nos vários continentes.

Num contexto mundial que se alterou, até pelo sucesso da crítica realizada e pelo crescimento da luta social em várias partes do planeta animadas por esta crítica, o papel do FSM passa a ser questionado internamente por vários de seus movimentos mais importantes. A mudança de qualidade do movimento alter-mundialista, a derrota das experiências políticas de coalisões de centro-esquerda na Europa, a adesão política deste continente – fenômeno crescente – ao pensamento de direita, a ainda frágil organização popular na Ásia e África – prioritários para a estratégia de expansão do FSM adotada com o rodízio de continentes para o evento centralizado e com a disseminação de experiências de regionalização de atividades, da qual o Dia de Ação de Global foi a mais recente – e o crescimento da opção político-eleitoral dos movimentos sociais da América Latina pela conquista de governos de esquerda e progressistas no continente colocam novas questões ao FSM.

Entre estas, que podem ser conhecidas no importante texto de Gustav Massiah sobre o debate ocorrudo na reunião do Conselho Internacional em Abuja – “O Estado do Debate” (ver www.forumsocialmundial.org.br/noticias_textos.php?cd_news=716), seria necessário localizar apenas duas que possuem importância central para o momento presente de crise e de busca de alternativas de esquerda à crise financeira e internacional do capital:
Há tempos os movimentos sociais mais organizados internacionalmente presentes no Conselho Internacional do FSM, com expressões como a Via Campesina, a CUT e outras centrais sindicais de peso e a Marcha Mundial de Mulheres, entre outras, vêm procurando compatibilizar a pluralidade constitutiva do FSM, que nenhuma força nega, com a necessidade de avanços em posicionamento políticos mais definidos e em articulações de lutas sociais internacionais mais ofensivas. Muitas vezes, essa demanda é verbalizada como a necessidade de avançar de um fórum de debates de alternativas para um fórum de construção de alternativas comuns, a serem implementadas. Parcialmente, essa demanda vem sendo atendida com o fortalecimento de espaços construídos no interior do FSM, como a Assembléia dos Movimentos Sociais e outras Assembléias temáticas, ou buscada através de mudanças metodológicas – até o momento, infrutíferas – para produção de sínteses a partir das dezenas, centenas de debates realizados nos eventos do Fórum.
Na verdade, além de uma resistência por parte de organizações não-governamentais e de agências de cooperação internacional a avançar na direção do atendimento dessa demanda dos movimentos sociais, está também em questão a dificuldade de compatibilizar esses posicionamentos políticos e agendas unificadas cobrados pelos movimentos sociais com a pluralidade política e ideológica que se mantém como cláusula pétrea da Carta de Princípios do FSM, aprovada para a sua primeira edição, em Porto Alegre. Os movimentos mais à esquerda, que propugnam alternativas socialistas para o neoliberalismo, se confrontam com posicionamentos muito mais moderados e pontuais – em particular das organizações não-governamentais da Europa.

Outra face dessa polêmica é a que diz respeito à relação entre partidos, movimentos sociais e governos na construção dessas alternativas. Os mesmos sociais que propugnam mais posicionamentos e mais ações comuns como eixos do FSM mantém relações, de várias naturezas, com experiências de governo que, em particular na América Latina, nasceram de eleições vencidas por partidos ou frentes políticas de esquerda ou progressistas neste começo de milênio. Em todos os casos, os movimentos sociais apoiaram e participaram das campanhas que deram origem a esses governos. Em diferentes graus de participação, integram com quadros oriundos dos movimentos os vários escalões de governo e participam de suas instâncias de participação popular no governo. Com um grau ainda maior de crítica, acompanham e disputam os rumos desses governos, em condições políticas que se distinguem pela trajetória histórica de cada país, pela correlação de forças no interior destes governos e na sociedade e pelo programa de cada governo.

Em todos os casos, os movimentos sociais mantém relações formais com estes governos e mantém igualmente uma capacidade crítica ditada pela sua autonomia e em respeito às bases sociais que representam. Não há casos significativos de ruptura entre o conjunto dos movimentos sociais e governos progressistas, sendo que o apoio crítico ou a independência com relações formais é característica de vários desses movimentos.

Esse debate suscita ânimos inflamados no contexto do Conselho Internacional e com as organizações que o compõem. Ainda que haja atividades auto-gestionadas que contam com a participação de militantes de movimentos sociais e membros de governos em todas as edições do FSM e de suas atividades regionais ou descentralizadas, pode-se dizer que estas são toleradas de mau humor por significativa parte do Conselho Internacional do Fórum, que não considera os governos como interlocutores válidos na construção de alternativas neoliberais.
Se nos movimentos sociais há uma clara diferenciação entre essas experiências de governo e as estratégias de relacionamento com cada uma delas, para parte significativa do Conselho Internacional há uma rejeição em bloco dessas experiências – de Chavez a Lula, de Evo a Tabaré, de Correa a Kirchner – como interlocutoras a serem buscadas para uma agenda comum. Esse debate se mostrou particularmente sensível no que diz respeito à presença desses Chefes de Estado nas atividades do Fórum Social Mundial e na aprovação do Guia de Princípios para Organização de Eventos FSM, em Copenhagen (veja a íntegra em www.forumsocialmundial.org.br/noticias_textos.php?cd_news=717, que resolveu a questão momentaneamente com a invocação da Carta de Princípios – “não deverão participar do Fórum representações partidárias nem organizações militares. Poderão ser convidados a participar, em caráter pessoal, governantes e parlamentares que assumam os compromissos desta Carta”.

Notas para a continuidade desse debate

Com certeza, o debate sobre as alternativas de esquerda para a crise do sistema neoliberal, em suas vertentes financeira, econômica, política, social e ambiental, estará no centro do FSM em Belém e na agenda política da esquerda mundial em 2009 e nos anos seguintes.

Será um debate com muitas tonalidades, e o PT precisa encontrar a sua, para levá-la ao debate no governo federal, aos partidos aliados, aos movimentos sociais e à sociedade brasileira como um todo, que recebe todos os dias enxurradas de informações fragmentadas e distorcidas sobre a crise, fundamentalmente através de meios de comunicação privados que apoiaram efusivamente a agenda neoliberal de ontem e a sustentarão novamente quando a crise passar ou para as eleições de 2010.
Urge politizar as ações do governo e carregá-las de uma carga ideológica capaz de fazer a opinião pública brasileira refletir sobre o sentido geral da crise que vivemos, da importância da ruptura política com os governos eleitos sobre a égide da agenda neoliberal com a vitória de Lula em 2002 e o alcance das medidas adotadas até agora pelo governo na reversão desta maré neoliberal que nos colocou de forma vulnerável ao extremo nas crises anteriores e que poderá nos ameaçar num futuro relativamente próximo se transformações mais profundas não forem implementadas.

Essas transformações deverão ser necessariamente pactuadas com o PT, os partidos aliados e os movimentos sociais, caso seu alcance seja realmente o de avançar no rumo de reformas democráticas e populares nos campos da economia e das relações sociais e políticas. Aí se verá o real caráter dos meios de comunicação e da oposição burguesa, bem como de setores conservadores da própria base parlamentar do governo, no apoio às medidas que enfrentam a crise sem alterar o rumo das políticas que a geraram.

Esse processo se dará em todo o continente. A relação entre Partidos Políticos, Movimentos Sociais e Governos de Esquerda e Progressistas da América do Sul, em especial, e da América Latina, em geral, é um tema que se coloca com dramaticidade e urgência ímpares. A definição de agendas comuns pós ou anti-neoliberais não implica na perda da autonomia entre Partidos, Movimentos Sociais e Governos. Os programas de cada instância se mantêm, a capacidade de crítica idem. Mas a necessidade de uma agenda comum, tema que já trabalhamos no debate realizado pouco antes da reunião do Foro de São Paulo em Montevidéu, em março deste ano, sob o tema “Movimientos Populares y Partidos de Izquierda en América Latina” (ver a íntegra dos dedbates em www.casabertoldbrecht.org.uy), é um desafio a ser vencido com respeito à independência e autonomia das instituições que se sentam à mesa e vontade política de fazer avançar projetos comuns.

No plano internacional, é evidente que as diferenças entre os partidos políticos de esquerda e progressistas do continente, em particular, e de outros continentes, em geral, sempre introduzem elementos de disputa de hegemonia no cenário continental e mundial. Mas avanços como a criação efetiva do Banco do Sul, o financiamento de infra-estrutura econômica e social contribuindo para o desenvolvimento e a redução das assimetrias entre os países, a inclusão de outros países, a começar da Venezuela, no Mercosul, a expansão para outros países do acordo feito entre Brasil e Argentina para eliminação do dólar como padrão monetário para o comércio bilateral, a coordenação de iniciativas no plano dos organismos multilaterais, entre outros, podem e devem ser acelerados. A troca de experiências de governo em áreas sensíveis como reforma agrária, geração de emprego e renda, participação popular em decisões de governo, e outros, interessam a partidos, governos e movimentos sociais. E, com certeza, uma agenda que inclua mudanças significativas no ordenamento das finanças internacionais e nacionais não será concluída sem força social que os movimentos sociais podem mobilizar no contexto de uma agenda comum.

Em maior ou menor escala, esse diálogo terá no Fórum Social de Belém um marco. Positivo ou negativo, depende dos atores políticos e sociais dispostos a construi-lo. Um Fórum que se restrinja a denunciar as mazelas do neoloberalismo e do capitalismo ou a reafirmar posições genéricas e principistas sobre a crise e suas alternativas, não será aceito por nenhuma das forças que o sustentam. Transformá-lo, como sem dúvida querem setores do esquerdismo internacional, num mero palco para denunciar a incapacidade dos governos progressistas da região amazônica de lidar com a devastação da floresta e o aquecimento global, o colocará num papel rebaixado frente às tarefas do momento.

O pós-Fórum será igualmente importante, pois muito que foi produzido naquele período terá que ser concluído com iniciativas concretas de ação. Muito do que não for produzido permanecerá como agenda em aberto, por espaços que devem vir a ser criados. O futuro do Fórum Social Mundial será definido a partir das respostas concretas que será capaz de dar à necessidade de debate dessas questões que com certeza lhes serão colocadas em Belém.

  • Renato Simões é Secretário Nacional de Movimentos Populares e Políticas Setoriais do PT, designado pelo Foro de São Paulo para representá-lo como membro observador do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Plenária Estadual da ES


No dia nove de novembro na cidade de Itapema a Tendência interna do Partido dos Trabalhadores Esquerda Socialista reuniu em plenária, militantes e direção da corrente.

Foi discutido e encaminhado uma série de demandas da tendência para o próximo período, incluindo a reunião do diretório do PT no dia 22 de novembro, o PED 2009, o texto sobre organicidade, demandas do movimento sindical e juventude, entre outras questões.

Foi uma plenária com muitas pessoas de diversas regiões, surpreendendo as expectativas.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Plenária Estadual da ES

Companheir@s!

Neste domingo dia 09 de novembro as 09:00 da manhã na camara de vereadores da cidade de Itapema acontecerá a Plenária Estadual da Esquerda Socialista.
Nossa plenária terá como pauta:
Abertura;
Conjuntura e Eleições 2008;
PED 2009 e eleições 2010;
Organização da Tendência;
Movimento popular e sindical;
Estão convocados os membros da corrente de todo o estado.
Atenciosamente:
Coordenação Estadual da ES

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Artigo de Atilio Boron, sobre os desafios do socialismo del siglo XXI-


O socialismo do século XXI: notas para discussão. Um artigo de Atilio Boron
"A burguesia não se depara com os falsos problemas que costumam paralisar o campo popular, esterilizado e desmobilizado em improdutivas discussões a respeito de se movimentos sim ou movimentos não, ou partidos sim ou partidos não", escreve o cientista político argentino Atilio Boron.
Atilio Boron, doutor em Ciência Política pela Harvard University, é professor titular de Filosofia Política da Universidade de Buenos Aires, Argentina, e ex-secretário-executivo do Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO). O artigo foi publicado no sítio La Haine, 04-09-2008. A tradução para o português foi feita por Dênis de Moraes e se encontra em seu blog, 02-09-2008.
O propósito desta conferência é contribuir com alguns elementos para a discussão sobre o socialismo do século XXI. O tema, não por acaso, está sendo objeto de uma intensa e crescente discussão. Se fizermos uma rápida consulta ao Google e verificarmos o número de páginas existentes sobre o "Socialismo do século XXI", veremos que aparecem listadas mais de 1.200.000.
Dado o volume da bibliografia existente, nos limitaremos a examinar algumas idéias que nos parecem centrais e que gostaríamos deixar como aporte para um futuro trabalho de elaboração coletiva. Não têm pretensão alguma de ser exaustivas; pelo contrário, devem ser compreendidas como uma contribuição parcial ao debate em curso, com vistas a se alcançar uma definição cada vez mais precisa do horizonte socialista das lutas emancipatórias de nossa época.
Abordaremos esta reflexão a partir de uma distinção tripartida entre:
1. Os valores e princípios medulares que devem ser a base de um projeto que se reivindique como genuinamente socialista.
2. O programa desse projeto, isto é, o trânsito desde o universo dos valores à agenda concreta da construção do socialismo e as políticas públicas requeridas para sua implementação.
3. Finalmente, o tema do "sujeito histórico" (ou os sujeitos) desse projeto e suas características distintivas.
1. Valores
Trata-se de um tema-chave, porque um projeto socialista não pode manifestar a menor ambigüidade axiológica em relação à sua crítica intransigente e radical à sociedade burguesa. À luz das experiências que tiveram lugar durante a fase "keynesiana" do capitalismo, não se pode alimentar a menor ilusão a respeito da capacidade de se conseguir reformas profundas e sobretudo duradouras na estrutura deste tipo de sociedade. A involução sofrida em conseqüência da contra-revolução neoliberal a partir dos anos 1980 demonstra, fora de dúvida, que os avanços que se tinham produzido nos anos do pós-guerra - e que deram lugar a múltiplas teorizações sobre "o fim das ideologias", o esgotamento da luta de classes, as virtudes da ascensão social, o triunfo da democracia liberal, etc. – estão muito longe de ser irreversíveis.
Esta reversão confirmou, uma vez mais, a extraordinária resistência do capitalismo e sua capacidade para retornar à "normalidade" de seu funcionamento explorador, predatório e opressivo, já que se dissipam as conjunturas ameaçadoras que, nos anos do pós-guerra, o obrigaram a fazer passageiras concessões às classes subalternas. Componente estratégico dessa conjuntura foi a ameaçadora presença da União Soviética. Apesar de sua doutrina oficial de "coexistência pacífica", justamente criticada por Che Guevara em diversas intervenções orais e escritas, a simples existência do exemplo soviético (e, posteriormente, da Revolução Chinesa) obrigou as burguesias metropolitanas a aceitar reivindicações que, antes de 1917, teriam sido respondidas apelando-se aos serviços da gendarmerie.
Isto posto, é preciso sublinhar que um socialismo renovado face ao século XXI não pode ficar reduzido à construção de uma nova fórmula econômica, por mais determinadamente anticapitalista que esta seja. Che tinha toda razão quando disse que "o socialismo como fórmula de redistribuição de bens materiais não me interessa". Trata-se da criação de um homem e de uma mulher novos, de uma nova cultura e de um novo tipo de sociedade, caracterizado pela abolição de toda forma de opressão e exploração, com o primado da solidariedade, o fim da separação entre governantes e governados e a reconciliação do homem com a natureza.
2. Projeto
A exposição anterior analisou, brevemente, a problemática dos valores e destacou a inquestionável superioridade ética do socialismo em relação ao capitalismo, tema que não se deve esquecer, a despeito de ser com freqüência deixado de lado. Vejamos agora o projeto e um caso especial: "o planejamento central" da economia, que, no passado, foi interpretado como essencial ao socialismo e que, hoje, aparece claramente como produto de uma época, não existindo razões irrebatíveis para que seja mantido no futuro.
Se, no marco do desmonte do Estado czarista, da Primeira Guerra Mundial e da selvagem agressão perpetrada contra a jovem República soviética, a socialização da economia foi assimilada com a total estatização das atividades econômicas, na atualidade essa receita não só é inadequada como também contraproducente para a consolidação de um projeto socialista nas condições atuais da economia mundial.
Se o modelo da estatização total da economia foi uma necessidade imposta por determinadas circunstâncias, isto não significa que deva ser a única alternativa de um projeto socialista. E tal conclusão é válida mesmo quando se leva em conta que, naquele tempo, esse modelo foi altamente exitoso porque tornou possível um formidável desenvolvimento das forças produtivas e converteu o país mais atrasado de Europa no começo do século XX numa grande potência industrial e militar. No entanto, suas conquistas numa fase de industrialização extensiva não foram suficientes para responder eficazmente aos novos desafios propostos pela terceira revolução industrial, com o desenvolvimento da microeletrônica, das telecomunicações, da informática e de todas as aplicações industriais derivadas destes progressos científicos. Gradualmente, foi perdendo terreno ante seus rivais capitalistas, até chegar à sua inglória derrubada final, quando todo o edifício político construído pela primeira revolução proletária da história – um acontecimento extraordinário na vida das nações – se desaprumou sem um só disparo, ante a incrível indiferença da população.
A magnitude do tema das grandes mudanças econômicas mereceu uma aguda observação do Comandante Fidel Castro em seu discurso de 17 de novembro do 2005, na Universidade de Havana, em comemoração ao sexagésimo aniversário daquela instituição. Disse, na oportunidade, que "seremos idiotas se acreditarmos, por exemplo, que a economia - e que me perdoem as dezenas de milhares de economistas que há no país - é uma ciência exata e eterna, e que existiu desde a época de Adão e Eva. Perde-se todo o sentido dialético quando se crê que essa mesma economia de hoje tanto faz em relação à de 50, 100 ou 150 anos atrás, ou tanto faz em relação à época de Lenin, ou à época de Karl Marx".
Fidel tem razão: a economia de hoje não é a mesma de 50 anos atrás. Não o são também nem o paradigma produtivo, nem as modalidades de circulação das mercadorias, nem as características do sistema financeiro, nem o entrelaçamento mundial do capital e o deste com os Estados dos capitalismos metropolitanos. Portanto, as políticas econômicas do socialismo devem necessariamente partir do reconhecimento das novas realidades. E, ao mesmo tempo, ter a humildade e a sensatez necessárias para desconfiar de fórmulas livrescas, pret-à-porter, que se apresentam como válidas, a todo tempo e lugar, para a construção do socialismo. Na mesma fala aos universitários, Fidel dizia que "um de nossos maiores erros no princípio e, muitas vezes, ao longo da Revolução foi crer que alguém sabia como se construía o socialismo". Lição importantíssima, não só por vir de quem veio, como também porque desafia a tendência pertinaz na esquerda de reduzir a construção do socialismo à aplicação de uma receita, um modelo, uma fórmula.
3. Sujeitos
Claramente, no plural. Não existe um único sujeito - e muito menos um único sujeito preconstituído - da transformação socialista. Se no capitalismo do século XIX e começos do XX podia postular-se a centralidade excludente do proletariado industrial, os dados do capitalismo contemporâneo e a história das lutas de classes sobretudo na periferia do sistema demonstram o crescente protagonismo adquirido por massas populares que no passado eram tidas como incapazes de colaborar na instauração de um projeto socialista. Camponeses, indígenas, setores marginais urbanos eram, no melhor dos casos, coadjuvantes num discreto segundo plano da presença estrelar da classe operária.
A história latino-americana, desde a Revolução Cubana até aqui, demonstrou que, ao menos nos capitalismos periféricos, o exclusivismo protagônico do proletariado industrial não foi confirmado pelos fatos. Basta recordar a caracterização de "povo" feita por Fidel Castro em A História me absolverá, ou o papel dessas massas populares urbanas e rurais nos levantamentos que tiveram lugar em Bolívia e Equador (e que se traduziram posteriormente nas vitórias eleitorais de Evo Morales e Rafael Correa), ou o heroísmo dessas massas na derrota do golpe de estado de abril do 2002 contra a Revolução Bolivariana, para apreciar, em toda a sua amplitude, a multiplicação dos sujeitos da resistência e oposição ao capitalismo.
Para finalizar, não poderíamos deixar de examinar esta problemática sem questionar a falsa oposição que costuma haver entre partidos e movimentos sociais. Lamentavelmente, nos últimos tempos esta oposição radical se arraigou muito profundamente no imaginário de numerosos atores sociais e políticos da América Latina e do Caribe. A conseqüência foi que, enquanto os partidos políticos de esquerda foram todos eles satanizados e considerados, sem se fazer distinção alguma – portanto, cometendo-se uma enorme injustiça com alguns que lutaram exemplarmente contra as ditaduras que assolaram nossos países nos anos 1970 e 1980 –, como aparelhos burocratizados, desmobilizadores e claudicantes, os movimentos sociais foram exaltados como excelsas organizações imunes às deformações burocráticas, às ambigüidades, aos personalismos e às mesquinharias que, segundo esta pouco feliz interpretação, caracterizariam aos partidos de esquerda da região. Tal simplificação não resiste à menor análise, e quem estiver minimamente informado sobre a realidade sociopolítica de nossos países sabe que vícios que se atribuem, muitas vezes com justa razão, aos partidos também afetam, em maior ou menor medida, os movimentos sociais. As exortações a favor da horizontalidade e o "basismo" nem sempre encontram uma tradução real na vida concreta dos movimentos e, não raro, são um discurso divorciado dos fatos. E as "novas formas de fazer política" com que os movimentos sociais muitas vezes se apresentam na cena pública para diferenciar-se da velha politicagem reinante costumam, mais fácil do que se imagina, dar lugar à ressurreição de práticas odiosas que se acreditavam exclusivas dos partidos.
Em outras palavras: partidos e movimentos representam dois modos de articular os interesses do campo popular, modos que não são contraditórios e sim complementares, entre outras coisas porque jogam em diferentes palcos: os partidos no marco das instituições políticas e os movimentos no seio da sociedade civil. Se os movimentos demonstraram possuir capacidade potencial para estabelecer uma conexão mais estreita com sua própria base e representar de maneira mais imediata seus interesses, evidenciam em contrapartida enorme dificuldade na hora de sintetizar a multiplicidade de particularismos que encarnam numa fórmula política e numa estratégia unificada que possa enfrentar com sucesso a estratégia unificada da burguesia.
Tanto os partidos como os movimentos parecem ignorar que a burguesia jamais aposta todas suas cartas num só palco, e sim, continuamente, combina táticas e estratégias que utilizam tanto os canais institucionais (as eleições e todas as instituições políticas do Estado) quanto os canais extra-institucionais: a rua, as mobilizações, a propaganda política, os meios de comunicação de massas, sabotagens, lock-outs patronais, fuga de capitais, greve de investimentos, chantagens sobre os governantes, etc.
Numa palavra, a burguesia não se depara com os falsos problemas que costumam paralisar o campo popular, esterilizado e desmobilizado em improdutivas discussões a respeito de se movimentos sim ou movimentos não, ou partidos sim ou partidos não. Profunda conhecedora do poder e seus segredos, a burguesia utiliza todas as armas disponíveis em seu arsenal, sem se importar com características específicas, enquanto seus opositores se desagregam estabelecendo primazias entre uma coisa e outra, ficando por isso mesmo à mercê de seus inimigos de classe.

Justiça condena Globo por fraude trabalhista

Uma jornalista contratada como pessoa jurídica para prestar serviços à TV Globo conseguiu o reconhecimento do vínculo empregatício com a empresa. A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou agravo de instrumento da emissora, entendendo haver evidências de fraude à legislação trabalhista nos contratos de locação de serviços. O ministro Horácio Senna Pires, relator do agravo, concluiu que o esquema “se tratava de típica fraude ao contrato de trabalho, caracterizada pela imposição feita pela Globo para que a jornalista constituísse pessoa jurídica com o objetivo de burlar a relação de emprego”. A Sexta Turma manteve decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ), que condenou a TV Globo à anotação da carteira de trabalho da jornalista, no período de maio de 1989 a março de 2001, com o salário de R$10.250,00. Ao avaliar prova pericial e depoimentos, o TRT constatou a presença dos elementos do artigo 3º da CLT – onerosidade, pessoalidade, habitualidade e subordinação -, que caracterizam o vínculo de emprego entre as partes. Assim, segundo o Regional, prevalece o que efetivamente ocorreu na execução prática do contrato, pouco importando a forma como se deu essa pactuação, pois o que interessa é a forma como se deu a prestação dos serviços, ou seja, o princípio da primazia da realidade do Direito do Trabalho. De 1989 a 2001, a jornalista trabalhou como repórter e apresentadora de telejornais e programas da Globo, como Jornal Nacional, Jornal da Globo, Bom Dia Rio, Jornal Hoje, RJ TV e Fantástico. No entanto, nunca teve sua carteira de trabalho assinada pois, segundo informou, a emissora condicionou a prestação de serviços à formação de uma empresa pela qual a jornalista forneceria a sua própria mão-de-obra. Para isso, ela então criou a C3 Produções Artísticas e Jornalísticas Ltda., que realizou sucessivos contratos denominados “locação de serviços e outras avenças”. Em julho de 2000, a repórter foi informada que seu contrato não seria renovado. Isso, segundo ela, depois de ter adquirido doença ocupacional: após exames detectarem um pólipo em sua faringe, ela foi submetida a tratamento fonoaudiológico pago pela Globo. No entanto, após a dispensa, teve que arcar com as custas desse tratamento e de cirurgia para a retirada do pólipo. Na ação trabalhista, além de vínculo de emprego, ela pleiteou, entre outros itens, o ressarcimento das despesas e indenização por danos morais, indeferidos pela 51ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro. A jornalista recorreu e o TRT da 1ª Região alterou a sentença quanto ao vínculo. Em um dos depoimentos utilizados pelo Regional para concluir pela existência da relação de emprego, um ex-diretor de jornalismo, a quem a autora foi subordinada, relatou que ela tinha que obedecer às determinações da empresa em relação a maquiagem, tipo de cabelo e roupas usadas durante a apresentação. Afirmou também que suas matérias eram determinadas pela emissora, e que eventualmente ela podia sugerir uma pauta e a idéia ser ou não acatada pela direção. Disse, ainda, ser ele, diretor, quem determinava o horário em que a jornalista tinha que estar diariamente na empresa. Além disso, o TRT da 1ª Região verificou que, nos contratos de prestação de serviços, apesar de haver a previsão de inexistência de vínculo de emprego, algumas parcelas tipicamente trabalhistas foram pactuadas, como o pagamento de “uma quantia adicional correspondente à remuneração que estivesse percebendo” nos meses de dezembro. O Regional entendeu que esse adicional era uma verdadeira gratificação natalina. “Nesse contexto, concluo que se tratava de típica fraude ao contrato de trabalho”, afirmou o relator do agravo no TST. Fonte: TST